Ao contrário do que muita gente pensa, a violência contra a mulher não acontece só quando há socos e pontapés. Aquela barbaridade que ele diz e você deixa passar, o comentário maldoso que fere a alma e a indiferença cotidiana também são formas de agressão – que destroem a auto-estima. E podem contribuir para você engordar! Veja como é possível se defender
por Marjorie Umeda
Televisão ligada no horário nobre. Na tela, Lilia Cabral na pele de Catarina e Jackson Antunes interpretando Leonardo, o marido violento. Mais uma cena da novela A Favorita, da Globo.
Mais uma cena que, embora às vezes exagerada, retrata a realidade. Assim como Catarina, muitas mulheres são desprezadas dentro de casa por seus companheiros. Não se sabe ainda como a história da personagem terminará, mas, na vida real, a agressão não precisa ser física para causar estragos. “A violência psicológica é extremamente nociva.
Como é invisível, fica mais difícil reconhecê-la e se defender. Apesar de não provocar escoriações, destrói a auto-estima”, diz Tânia Rocha, professora de ciências sociais da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB) e autora do livro O Preço do Silêncio: Mulheres Ricas Também Sofrem Violência (edições UESB). Com a auto-estima em pedaços, é mais complicado sair de uma relação abusiva. Tem mais: a humilhação verbal abre uma brecha para a violência física. “O tapa aparece subitamente, mas é fruto de uma relação desrespeitosa. A violência é um processo que começa na agressão verbal”, diz a professora.
O corpo reage e engorda
Viver sob constante humilhação acarreta vários danos. O relacionamento sofre, a família é colocada em risco, o lar tem papel invertido – em vez de aconchego, representa insegurança. Isso gera descompasso em outras áreas, como na alimentação. Você está infeliz, come mais, engorda, fica menos confiante, torna-se mais vulnerável às críticas, fica infeliz, come mais... “A mulher sente falta de afeto e respeito. Uma das maneiras de apaziguar essa carência é exagerar na comida, que serve para preencher outros vazios”, diz Marco Antonio De Tommaso, psicólogo e consultor da BOA FORMA. Mas exagerar à mesa não é a única forma de descontrole – é apenas a mais visível no espelho. “Você também tende a ficar desatenta no trabalho”, diz Tommaso.
Ao ler um comentário como esse, não há dúvida de que ele é agressivo e desrespeitoso. Mas, na hora em que escuta, a mulher pode se perguntar se ela não está sendo intolerante por associá-lo à violência verbal. Ou se, no fundo, o marido fez apenas uma piada infeliz. “Um dos caminhos que fazem perpetuar a violência é a banalização dos acontecimentos”, diz Tânia Rocha, socióloga. “A vítima se sente mal, fica desconcertada, triste, mas prefere acreditar que o que aconteceu é natural e segue em frente, muitas vezes sem saber que com isso sinaliza que suporta qualquer abuso”, completa.
A auto-estima despenca porque ele diz isso ou ele se sente à vontade para fazer comentários maldosos porque a auto-estima já está lá no pé? Sempre que uma pessoa se sente livre para fazer mal a você é porque seu amor-próprio está lá embaixo. “Quem não confia em si mesma, tem medo de sinalizar para o outro até onde ele pode ir e muitas vezes se convence de que ouviu o que ouviu porque fez alguma coisa errada”, diz Tommaso, psicoterapeuta. Assim, fecha os olhos para o desrespeito e deixa passar. “Com o receio de perder o companheiro e ficar sozinha, tem mulher que tolera qualquer coisa. O parceiro sente essa dependência e a relação sofre.”
Desfile de celulite
Estava com meu marido e um casal de amigos. Contava como era grande a loja em que experimentei um biquíni. Aí, meu marido disse: ‘Que bom, assim você teve espaço para fazer um desfile de celulite’. Quase morri de vergonha” Sônia, por e-mail.
Stripper frustrada
Um dia falei ao meu namorado, brincando, que queria trabalhar como stripper. Ele disse que eu passaria fome porque era baixinha, gordinha, tinha barriga e bumbum bem ruinzinhos. Fiquei com a auto-estima lá no pé” Cássia, por e-mail.
Mulher invisível
Não são só as palavras que ferem. Meu namorado é muito ciumento, mas em vez de fazer escândalo ele me ignora. Faz de conta que eu não existo e dorme ao meu lado como se estivesse sozinho na cama” Ana Lúcia, por e-mail.
O bate-boca não é a única maneira de vivenciar uma atitude violenta. O silêncio, dependendo da maneira como ele ocorre, também é altamente agressivo. “Imagine um casal em que o marido não olha para a mulher, a ignora e evita ter relações sexuais com ela, noite após noite. Ela vai se sentir pouco atraente, pouco interessante. É uma ação silenciosa, mas agressiva, que desqualifica a parceira”, diz Tommaso. A atitude fere a auto-estima e a mulher fica frágil e insegura. “A indiferença é uma forma de ferir, mas ela é ainda mais difícil de medir do que o abuso verbal, que, por sua vez, é menos evidente que o físico”, diz Tânia. Uma das maneiras de se proteger é estar sempre atenta à relação e não ter medo de se perguntar diariamente: “Esse homem me respeita?” Uma relação a dois precisa disso para se manter. E você, como responde a essa pergunta?
5 lições para se proteger
1. Ser ofendida não é natural
Se você sentiu-se mal por algum comentário do seu marido, considere que você tem um problema e pense em como resolvê-lo. Pior ainda se isso acontecer de modo constante. O natural e esperado é uma relação com carinho e afeto.
2. Seja assertiva, converse
Não tenha receio de expor o seu ponto de vista e o seu descontentamento. Quando você se mostra confiante, a outra pessoa tende a respeitá-la.
3. Não tenha medo de ficar só
Foque no seu bem-estar e não deixe de tomar uma atitude por receio de ser abandonada. Se isso acontecer, pense bem: talvez você saia ganhando.
4. Tenha com quem compartilhar
Busque uma rede de apoio, pode ser a família, os amigos. Explique como se sente e permita que as pessoas a acolham. Isso vai fortalecê-la.
5. Cuide da auto-estima
De novo ela. Quando você gosta de si mesma, não tolera violência. Por isso, cuide-se, faça o que gosta, aceite-se e ganhe o respeito das outras pessoas.
Contra a violência
A atriz americana Reese Whitherspoon também está engajada no combate à violência. Ela é embaixatriz da campanha Fale Sem Medo – Não à Violência Doméstica, da Avon. “É chocante que 1 bilhão de mulheres no mundo inteiro – uma em cada três – sejam afetadas pela violência em algum momento de suas vidas. Na América Latina, entre 30 e 40% das mulheres com mais de 15 anos já sofreram algum tipo de agressão dentro da própria família”, diz Reese.
A atriz esteve no Brasil recentemente para fazer o lançamento da pulseira da atitude, símbolo da campanha. Com esse acessório, a Avon pretende arrecadar 500 mil reais no país, que serão doados ao Fundo das Nações Unidas para o Desenvolvimento das Mulheres (Unifem). A pulseira custa 5 reais e 4,05 reais serão revertidos em benefício da causa.
* Os nomes foram trocados para preservar a identidade das leitoras.
Fonte: Revista Boa Forma
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